#novelascfz
Categoria
😹
DiversãoTranscrição
00:00:0060 anos, 60 horas, o Globo Rural nas comemorações de aniversário da TV Globo.
00:00:16A vida nas fazendas, a beleza dos cenários, o dia a dia de quem inspira a ficção.
00:00:22Graças a Deus, estou vivo de melhorar a estrada.
00:00:25Desse sítio saíram várias histórias sobre o mundo rural.
00:00:29O dono é Benedito Rui Barbosa, o escritor que mais retratou o campo em suas novelas.
00:00:36O senhor foi feliz escrevendo novela?
00:00:38Eu fui. Foi muito bom pra mim. Aprendi.
00:00:55Bom dia.
00:01:03Olá.
00:01:03Oi, gente. A televisão é uma via de mão dupla.
00:01:07Promove o intercâmbio do que acontece tanto na cidade quanto no campo.
00:01:12Campo que não produz só comida e matéria-prima.
00:01:15A roça alimenta também a nossa imaginação.
00:01:19É fonte de cultura.
00:01:20O universo rural veio pra telinha em boa parte das 338 novelas produzidas pela Globo desde a inauguração em 1965.
00:01:31Na primeira parte do nosso programa especial, eu mostro que a ficção não exagera quando representa agricultores reais.
00:01:40O mundo das novelas é povoado por casais improváveis,
00:01:52dramas sentidos,
00:01:55comédias pitorescas,
00:02:03paisagens estonteantes
00:02:06e tipos que deixam tatuados no gosto popular os seus bordões.
00:02:12É justo.
00:02:14É injusto.
00:02:16É justíssimo.
00:02:17É conversa.
00:02:20Tô certo ou tô errado?
00:02:23Algum desses personagens tem semelhança com gente de verdade que você conhece?
00:02:28Um famoso escritor, Oscar Wilde, dizia que a vida imita a arte.
00:02:32Pois na Serra da Mantiqueira, em Minas Gerais, uma pessoa nos faz pensar que, na verdade, a arte imita a vida.
00:02:40Oi, João.
00:02:41Bom dia.
00:02:43Bom dia, meu.
00:02:44Tudo jóia?
00:02:45Tudo bom, João?
00:02:47Graças a Deus.
00:02:48Tô vivo, rapaz.
00:02:49Quem mais que eu quero?
00:02:50Graças a Deus.
00:02:51Tô vivo.
00:02:51Se melhorar, estraga.
00:02:52Esse é o bordão de quem você vai conhecer.
00:02:56Tô vivo, João.
00:02:57Graças a Deus.
00:02:58Bom dia.
00:02:58Tô vivo, né?
00:02:59Eu me encantei com a alegria desse cumprimento.
00:03:02Tudo bem?
00:03:02Tô vivo.
00:03:03Desde a primeira vez que falei com o João.
00:03:05E foi uma surpresa saber depois dos dramas...
00:03:10Desculpas.
00:03:11...e das comédias...
00:03:13...que ora clareiam, ora anuviam o mundo do João Carlos Ribeiro.
00:03:19Tive contato com ele pela primeira vez, quando precisava transformar um pasto antigo em pomar,
00:03:25sem usar trator.
00:03:27Um agrônomo me indicou.
00:03:28A solução é tração animal.
00:03:30E o cara é o João Boiadeiro.
00:03:33Ele não só arou, como ajudou a plantar oliveiras, peras, amoras, dezenas de frutas.
00:03:42Eu não tinha dinheiro pra comprar um cavalo.
00:03:44Então eu pegava uns cavalo pra mançar, ganhava uns trocos.
00:03:48E tinha o cavalo pra me poder passear, andar um pouco.
00:03:51Quando eu conheci o João Boiadeiro, eu imaginava que ele era chamado assim por causa da condução de boiadas de uma fazenda pra outra.
00:03:59Não é por isso, embora, mexa muito com gado.
00:04:02O apelido vem por causa daquela aração de terras que eu já mencionei.
00:04:07Comecei com quatro boi e cheguei a ter até sessenta boi caíram, arandela, pra tudo lado.
00:04:15Na verdade, João montou uma equipe junto com os irmãos.
00:04:19Calcula que fizeram uma aração de mais de cinquenta mil hectares.
00:04:23O cara comprava uma fazenda e eu pegava ela, formava a lintela, fazia o estado, fazia acerto, entregava pronto pra ele.
00:04:31Quando eu conheci o João, que foi por intermédio de negócio...
00:04:36Só para o pecuarista Ricardo Lima, a turma do João formou pastos, tudo em ladeira, pra engordar mais de duas mil cabeças de gado.
00:04:44Eu tinha o João como um ser iluminado.
00:04:47Não é iluminado.
00:04:50É luminoso, irradia a luz, é diferente, é outro patamar.
00:04:55Sou caipira com orgulho de ser caipira e tocar a minha vida do jeito que eu sou.
00:05:01A aparência de ermitão, cara fechada, esconde a figura mais popular da região de Passa Quatro, Minas Gerais.
00:05:08Conhece todo mundo e todo mundo conhece.
00:05:12João Boiadeiro vive no tipo de lugar que uma moda caipira chama de pedacinho do céu.
00:05:18Duzentos hectares, casinha no pé do morro, uma pintura.
00:05:23Nada vindo de mão beijada.
00:05:25Subir na vida, pra quem nasce e tem que se equilibrar na chamada linha de pobreza, é uma façanha.
00:05:36Intranspunível, na maioria das vezes.
00:05:38Pois o João Boiadeiro conseguiu comprar a fazenda onde ele foi peão.
00:05:42E um dos segredos pra isso, você vai ver agora.
00:05:45Quatro da manhã, já está no curral.
00:05:47Nessa idade, você precisa acordar de madrugada e chegar às quatro horas no curral?
00:05:57Não é que precisa, mas a gente já acostumou.
00:06:01Embora tenha ordenhadeira mecânica e funcionário, o Juracir Antunes Ujure, que o acompanha há três décadas e meia,
00:06:09O que ele tira é com as mãos, feito quem nas cidades acorda cedo pra malhar na academia.
00:06:15Isso pra mim é uma filoterapia, é a minha vida.
00:06:18O povo tem maneira de falar que o leite é ruim, se você não souber trabalhar.
00:06:22É o que o meu avô falava, o gado é sagrado.
00:06:25Quem mija pra trás, manda o dono pra frente.
00:06:29Já te conheço?
00:06:29Quase sempre ele é engraçado, mas na entrada da fazenda tem um lembrete de que aqui há uma dor que o tempo não apaga.
00:06:41Saudades de Angelina e Alessandro.
00:06:45É difícil demais da conta, demais da conta.
00:06:50Em 2004, João toma a precaução de comprar um jazigo.
00:06:55Entra num pesadelo jamais imaginado.
00:06:57Alessandro, o filho mais velho, sofre um gravíssimo acidente de trabalho com fios de alta tensão.
00:07:0413 mil volts.
00:07:06Você sabe que se chegar no hospital, aonde você põe a mão, sai a carne do seu filho e com o meu amigo.
00:07:13Eu tinha terminado o turma na sexta-feira, no sábado ele sofreu um acidente, segundo ele morre.
00:07:21Eu põe ele no topo.
00:07:22Eugelina, a primeira esposa que nunca desmanchou o quarto do filho, no desgosto morre um ano e pouco depois.
00:07:31Isso que eu perdi a mãe, o que que eu fiquei? Fiquei órfão.
00:07:34Perdi a mulher, fiquei viúvo.
00:07:36Perdi um filho, nem nome tem.
00:07:39Nem nome tem.
00:07:42Não tem um dia que eu não choro dos cantos.
00:07:44Não há coisa ruim que não se acabe, nem coisa boa que dure pra sempre.
00:07:55Não há mal que o bem não cure.
00:07:57Depois das perdas dramáticas que sofreu, a história do João Boiadeiro teve uma virada.
00:08:03A vida, como ele diz, voltou a ficar viva de novo.
00:08:06Um anjo apareceu.
00:08:07No próximo bloco, você vai ver a reviravolta que aconteceu na vida do João Boiadeiro.
00:08:16Até já.
00:08:29Voltamos com o Globo Rural nas comemorações dos 60 anos da Globo.
00:08:33Hoje, com um programa especialíssimo, fazendo uma dupla visita.
00:08:38As novelas que retratam o mundo rural e um pé no chão real da nossa vida no campo.
00:08:44Vimos no primeiro bloco as tramas dramáticas vividas pelo João Boiadeiro.
00:08:50Agora, vamos a reviravolta que o destino lhe traz quando encontra um anjo.
00:08:55O anjo que o João encontrou tinha nome Valdirene, sobrenome Martins, agora também Ribeiro, e apelido Sinha.
00:09:07Então, com 24 anos, ele com 43, alimentando as futricas a favor e do contra.
00:09:14Tinha os que falavam que eu era louca, né?
00:09:17Você é louca, ele é muito mais velho, já tem família formada.
00:09:21De fato, Sinha tinha praticamente a mesma idade das filhas do João, Valdirene, Adi e Helena, Alena.
00:09:29Além do que, já havia um folclore na cidade, viu?
00:09:33Ah, falava bastante. Falava ele, nem banho, não gosta de tomar, né?
00:09:37Tinha toda essa conversa assim.
00:09:39Esta é uma brincadeira que todos gostam de fazer com ele.
00:09:44É o cascão da cidade.
00:09:46Você trocou até de roupa? Só não tomou banho.
00:09:48Só tu vê que ele está cheiroso.
00:09:50Ah, não está não.
00:09:52O homem é sério, o homem é prata fina.
00:09:55Esse que está falando aí é o juiz da cidade, doutor Fábio Caruso,
00:09:59junto com o advogado Milton Costa e o funcionário público José Salles.
00:10:03São costumeiras aqui, rodinhas de gozação assim, culminando sempre em risadas de espantar pão.
00:10:11Queria eu ver, né?
00:10:13Você consegue saber que ele está chegando muito tempo antes de chegar.
00:10:17É, pelo cheiro.
00:10:18Todo mundo fala, ah, ele não cheira bem.
00:10:21Não é que não cheira bem, cheira curral, né?
00:10:23Ele cheira curral.
00:10:23Mas, nossa, eu amava o cheiro dele.
00:10:26Gosto até hoje, lógico.
00:10:28Do jeito que sai do curral, João vai a um compromisso na cidade, a uma loja,
00:10:33a uma audiência no fórum, onde o doutor Hilton Costa,
00:10:37de tanto vê-lo ser testemunho em processos de aposentadoria rural,
00:10:41lhe deu um presente.
00:10:42Eu fiz um cartãozinho para ele, João Carlos B, testemunho.
00:10:46Olhei no meu cartão de advogado, João Carlos B, testemunho,
00:10:48coloquei o telefone para facilitar a vida.
00:10:50Ah, né, de quem precisar, né?
00:10:53E sempre com o indefectível chapéu.
00:11:01O uso que copiou do pai, seu Daniel,
00:11:04que aos 87 anos ainda está na lida,
00:11:06inclusive amansando o garrote e fazendo a própria comida.
00:11:10É tal pai, tal filho, né?
00:11:12O chapéu preto foi de toda a vida.
00:11:15Mas tem?
00:11:16Nem de mulher, nem de moleque.
00:11:19Ah, não sei o chapéu, mas para encontrar com a bunda de fora.
00:11:21Se eu não tiver chapéu, não dá bom, mas nem.
00:11:25Aí a bagagem era grande, viu, Nelson?
00:11:27E não é que ele chegou a vestir terno e gravata?
00:11:30Com votação expressiva, foi eleito vereador.
00:11:34Mas injeitou a reeleição.
00:11:36Eu não quero mexer mais política, porque só troca a colina,
00:11:40a cachorrada é a mesma, gente.
00:11:42Então não adianta mexer.
00:11:43No começo não foi fácil, né?
00:11:47Sinha não se intimidou.
00:11:49Abraçou a causa, o ponde lotado do jeito que já vinha.
00:11:52Se envolveu, se entrosou e virou um eixo da família.
00:11:56Eu posso falar que eu sou muito feliz, né?
00:11:58Hoje, sabe, Nelson?
00:11:59Muito feliz.
00:12:01Tenho a família que ele já tinha como minha.
00:12:05Acho que não vivo sem eles por nada.
00:12:08Amo eles de coração.
00:12:09Família grande, que gosta de se reunir.
00:12:13Quebrar sacos de espigas para fazer quitandas de milho.
00:12:16Organizar mutirões de pamonha.
00:12:21As filhas de Helena, mais a Sinha,
00:12:25sempre no tripé de apoio às aventuras culinárias do João,
00:12:29que é mestre em comida de roça.
00:12:31Inclusive, é uma das atrações na feira gastronômica de Passa Quatro,
00:12:36onde cozinham para multidões.
00:12:40Cozinham para as festas da igreja.
00:12:42Cozinham para a Santa Casa, para o asilo, para a Pai.
00:12:46Ele é uma figura realmente meio carismática.
00:12:49Faz muita caridade que ele não fala, mas a gente sabe o que ele faz.
00:12:52Porque ele não fica espalhando, a gente sabe.
00:12:57Eu já lembrassei o senhor.
00:12:58Oh, obrigado, gente.
00:13:00E não é só com o povo de Passa Quatro.
00:13:03O casal dá muita atenção também aos romeiros,
00:13:05que fazem peregrinação por aqui a caminho de Aparecida.
00:13:08Graças a Deus, estamos vivos, né?
00:13:10A Daniela Moreira da Silva fez promessa para se afastar do alcoolismo.
00:13:15Vem a cavalo com o grupo que sai da região de Belo Horizonte.
00:13:19E hoje faz 16 anos que eu venho em Aparecida.
00:13:23Cada ano que passa, eu venho cumprir essa promessa.
00:13:26Todo ano, entre maio e outubro, de 20 a 25 romarias montadas pernoitam aqui na fazenda.
00:13:35João e Sinha oferecem toda a infraestrutura de pouso sem cobrar nada.
00:13:40A turma já vem com dinheiro para pagar, ele não aceita de jeito nenhum.
00:13:44É.
00:13:45De jeito nenhum, é de coração aberto mesmo.
00:13:47Como se a gente estivesse na nossa casa mesmo, né?
00:13:50Ele recebe como se nós fôssemos filhos dele, filhas dele, né?
00:13:54A devoção fortalecida com os romeiros levou sim a fazer uma promessa também, para o João escapar da Covid.
00:14:02Desde o mais católico ao evangélico, foi tantas pessoas orando, rezando, fazendo promessa.
00:14:12Eu não tinha mais força para rezar.
00:14:14João tinha acabado de se recuperar da extração de um tumor na pélvis, já de volta aos seus mil e um afazeres,
00:14:22como a extração de madeira comercial, quando o vírus o abateu.
00:14:26O Nelson, eu internado, 28 pessoas, a gente vendo um morrendo.
00:14:33Ele conta que estava há três semanas internado, já no pulmão artificial,
00:14:38quando ouviu que os exames tinham piorado e que no dia seguinte podia ser entubado.
00:14:43Puxei um lençol no rosto, chorei demais, porque eu não estava aguentando mais.
00:14:48Você está vendo em desespero.
00:14:50Certo de que não voltaria para casa, testemunhando quatro, cinco mortes por dia onde estava,
00:14:56na manhã seguinte foi surpreendido pela pergunta de uma enfermeira.
00:15:00Ela chegou em mim e falou,
00:15:01Nossa, João, o seu oxigênio está desligado.
00:15:05Quem que desligou esse oxigênio, gente?
00:15:08Se ninguém mexeu comigo.
00:15:13Incrédulos, os médicos deram alta para o João dois dias depois.
00:15:17A promessa da senha, se o marido voltasse vivo,
00:15:20era construir esta igrejinha para a Nossa Senhora Aparecida.
00:15:26Nessa altura você já pode estar pensando,
00:15:29puxa, a vida desse cara daria uma novela.
00:15:32Para falar sobre isso com mais propriedade,
00:15:36nós convidamos um especialista no assunto,
00:15:39o pesquisador Nilson Xavier.
00:15:42Ele já deu um rolê pela propriedade,
00:15:44conheceu a bezerrada do gado de leite,
00:15:48sentiu a sensação de pisar no ambiente de trabalho do João Boiadeiro,
00:15:52as terras altas da mantiqueira.
00:15:55Tirou muitas fotos
00:15:56e admirou, sobretudo, a espaçosa cozinha da Sinha e do João.
00:16:02O protagonismo do fogão a lenha no meio de tudo
00:16:05e o ladrilho do chão ao teto.
00:16:07Linda, linda a cozinha.
00:16:08Parece cenário de novela, hein?
00:16:10Bonito, bonito para caramba.
00:16:12Você teve alguma referência, alguma coisa assim?
00:16:15Sempre fico muito apaixonada nessas novelas de épocas, sabe?
00:16:20Ah, sim.
00:16:21Aí a gente vai vendo, tendo ideias, né?
00:16:24Os dois são noveleiros doentes.
00:16:26Tanto que, no dia do Cajório,
00:16:28João pediu que tocassem o tema da novela
00:16:31Sim, a Moça, remake de 2006.
00:16:33Sim, a Moça, minha guia,
00:16:35minha estrela, noite e dia.
00:16:37Ela não sabia de nada e tocou sim a moça.
00:16:43No casamento?
00:16:44No casamento.
00:16:45Isso.
00:16:46Aí?
00:16:47Aí, pronto, né?
00:16:49Acelerou o coração, foi?
00:16:51Convidados foram a cidade inteira, né?
00:16:53Que convidou no rádio, né?
00:16:55É mesmo?
00:16:56Sim, mas...
00:16:57Foi anunciada no rádio e a população compareceu em pesos na igreja.
00:17:01Teve umas 5 mil pessoas lá, mais ou menos?
00:17:045 mil pessoas.
00:17:05Mais ou menos.
00:17:05Eu matei só 5 boi, só.
00:17:08E eu tenho mambu pra plantar.
00:17:10Tudo que eu planto cresce direitinho, cresce bonitinho.
00:17:11Eu também tenho mambu.
00:17:13Você tem mambu é pra passar.
00:17:15Você vai trabalhar, vai trabalhar, vai trabalhar que você não conheceu laranja nenhum ainda hoje.
00:17:19O João, ele lembra muito o seu Samutema, da novela O Salvador da Pátria.
00:17:24E o José Leôncio, da novela Pantanal.
00:17:27E assim seria a romântica dos protagonistas.
00:17:32Abre o coração, você tá falando com o seu sentimento, bota tudo pra fora.
00:17:35Eu não posso viver sem você.
00:17:37Eu também não suporto ficar longe de você.
00:17:43Nossa, eu sou bem romântica.
00:17:46Bem romântica.
00:17:47Bem, assim, bem aquela sofredora da novela lá.
00:17:51Bem sonhadora.
00:17:52Sonhadora.
00:17:52Na cidade, Nilson Xavier pôde testemunhar um fato para o qual a reportagem foi provocada.
00:18:01Ao saber que o Globo Rural estava na área, um grupo de moradores nos pede pra dizer umas verdades sobre o casal.
00:18:09Era uma surpresa.
00:18:10A amizade se será um santo repédio ao abrigo do Senhor.
00:18:18Numa ocasião, o bairro aqui ficou três semanas sem água.
00:18:21João levava todo dia um caminhão-pipa e marmitas pra eles.
00:18:25Ficaram agradecidos.
00:18:26Onde o pico, o amigo, o sonha.
00:18:30Esse é o momento de catarse, né?
00:18:32Que é aquele momento em que o que o público anseia, esperou durante vários capítulos ou às vezes vários meses, acontece.
00:18:41João, sim, é o filho deles, João Tiuim, os moradores, até as pedras da rua se comovem.
00:18:51A gente acha que as novelas, elas exageram no melodrama, no amor, no romantismo, mas isso acontece na vida da gente, né, Nelson?
00:19:02Nilson Xavier usa uma expressão da filosofia e da crítica literária.
00:19:07São arquétipos, né?
00:19:08Arquétipos são modelos universais de comportamento que acabam virando clichês nas novelas, tipo vilão e mocinha.
00:19:19João é arquétipo do herói.
00:19:21A vida dele é a trajetória do herói, né?
00:19:23Ele parece saído de uma telenovela.
00:19:26Seu João é amizade personalizada.
00:19:29Um herói caipira, com tantos que estão por aí, consagrando seu grãozinho de areia pra fazer o mundo melhor.
00:19:41Por quê?
00:19:42Estamos vivos.
00:19:43Tem mais que mexer, né?
00:19:44Olha, gente, essa trança dos personagens do agro-real com os do agro-ficção tá só começando, viu?
00:19:56Tem muita coisa boa pela frente aí.
00:19:59O repórter César Daci vai dar uma palhinha do que você vai ver no próximo bloco.
00:20:03Olha, Nelson, nós vamos falar de um período nada bonito na história do Brasil e que também virou assunto de novela.
00:20:13Até já.
00:20:14O Brasil viveu vários ciclos econômicos ao longo da história.
00:20:29Teve o do ouro, da cana, do café.
00:20:32Mas nenhum deles existiria se não fosse a mão de obra forçada de negros e indígenas.
00:20:38Esse duro período da nossa história também foi tema de novelas.
00:20:44Um Brasil pra ser desbravado.
00:20:51Foi pelas matas do nosso litoral que se deu o primeiro contato entre nativos e estrangeiros.
00:20:59Não foi um encontro amistoso e as emboscadas pra captura dos indígenas marcaram a fase inicial da nossa história,
00:21:14nessa busca por mão de obra pra conquista da terra.
00:21:23Depois, o trabalho braçal recaiu sobre um povo trazido do outro lado do oceano atlântico.
00:21:29Deixe-me ver esta boca, uma boca saudável, é sinal de boa saúde.
00:21:35As marcas desse passado escancararam ainda mais essa dor quando ganharam as cores da televisão.
00:21:42Desde o descobrimento, o Brasil viveu mais tempo na escravidão do que na abolição.
00:22:03Mais que o dobro, na verdade, da lei áurea até agora, foram menos de 150 anos contra mais de 300 dos períodos colonial e imperial.
00:22:15O tráfico de escravizados trouxe pra cá pelo menos 4 milhões e meio de africanos em mais de 9.200 viagens de navio.
00:22:24Fiscais do Ministério do Trabalho resgataram oito trabalhadores em situação semelhante à escravidão numa fazenda de Novo Gama, Goiás.
00:22:42Novelas como Sim a Moça e Escravizaura mostraram as feridas que se abriram no corpo do açoitado e na alma do piedoso.
00:22:52Não se faz isso com criaturas humanas.
00:22:56Sei justo demais, meu Deus. Uma inocentezinha feito essa. Um dia vai ter que conhecer a liberdade.
00:23:05E conheceu. A abolição chegou e também foi retratada por esse gênero televisivo chamado de novela de época.
00:23:1413 de maio, guardem essa data. A escravidão está abolida do Brasil.
00:23:22A notícia se espalhou pra mais de 700 mil escravizados que existiam no Brasil.
00:23:31A maioria, trabalhadores das nossas lavouras.
00:23:34O professor de história, Roberto Freitas, já deu muita explicação aos visitantes dessa fazenda no município de Barra do Piraí, no Rio de Janeiro.
00:23:48A propriedade fica no Vale do Café, uma importante região para a história do Brasil.
00:23:54Teve muito sofrimento. A escravidão foi um crime contra a humanidade em nome da construção do nosso país.
00:24:00A formação da sociedade brasileira, como nós conhecemos hoje, passa necessariamente pelas fazendas do período colonial.
00:24:09A arquitetura da Casa Grande e Senzala está no nosso imaginário como um divisor das condições sociais, econômicas, de poder e violência,
00:24:19que tem seus reflexos até os dias atuais.
00:24:22E não só isso. A mistura que houve nessas terras foi determinante para a nossa identidade enquanto povo.
00:24:31Nós somos um país de mestiços.
00:24:35Indígenas, branco e africano.
00:24:39E o senhor de engenho estava observando tudo?
00:24:41Sim, a casa era sempre no alto, onde ele tinha a visão de toda a fazenda, de toda a produção do café.
00:24:48Eram pelo menos 500 mil pés de café, plantados onde antes era só floresta.
00:24:55Se a gente olhar para a sede aqui, para esse quadrilátero, o que ele representa?
00:25:00Ele representa como era a produção no século XIX.
00:25:03Ele é formado pela Casa Grande, pelo engenho de despolpamento de café, pela Casa do Feitor, pela Senzala,
00:25:11e no último ponto é a enfermaria, construída por volta de 1850, depois da lei Eusébio de Queiroz, que proíbe o tráfico.
00:25:20Então eles vão cuidar das pessoas. Não é questão humanitária, é questão econômica.
00:25:24Eles precisam dessas pessoas produzindo.
00:25:28Porque não podia mais trazer.
00:25:29Não podia mais trazer.
00:25:30Então eles tinham que cuidar.
00:25:31Tinha que cuidar. Morrer era um prejuízo.
00:25:34Olha, e essa fazenda é tão preservada que foi até cenário de novela.
00:25:39Sim. A última novela que a Globo filmou aqui foi Nos Tempos do Imperador.
00:25:44São seus súditos. Eles te amam.
00:25:47Então é um cenário do século XIX vivo aqui.
00:25:51Esse outro casarão em Barra do Piraí data de 1830 e sempre pertenceu a uma só família.
00:25:59Sou a sexta geração dessa família.
00:26:02Meu teto avô construiu o casarão, que era escravocrata.
00:26:05Era o barão.
00:26:06Na verdade ele foi um comendador, um título abaixo de barão.
00:26:09Mas já fazia parte desse ciclo político, aristocrático, rural da época.
00:26:15Então a história dessa fazenda não é nada bonita.
00:26:18Não é nada bonita e nesse período o ser humano levou o limite da maldade.
00:26:24Que é escravizar. O contrário de amar o próximo é o quê?
00:26:27Escravizar o próximo.
00:26:28Então, por mais duro que tenha sido esse passado, a gente tem que mostrar e tem que falar dele para que não aconteça novamente.
00:26:37Mesmo de outras formas, outros tipos modernos de escravidão.
00:26:44Com o fim da escravidão, os negros não receberam nenhum tipo de apoio, reparação ou indenização.
00:26:51Na história da nossa agricultura, ainda há muitas feridas abertas.
00:26:58O Melquíades e o Lourenço trabalham num esquema de parceria.
00:27:04Roçam e limpam a lavoura de café em troca de um pouco de terra para plantar.
00:27:09Eu plantei milho, plantei feijão, plantei pizza, tudo aqui.
00:27:12É. E funciona bem assim?
00:27:14Funciona. Funciona porque a pessoa tendo o que comer é melhor do que ter dinheiro.
00:27:19A gente não é empregado. O que você tira com o giló fica para você.
00:27:24É. Ele já ganha o café limpo e a gente tem o terreno e a planta por conta da gente.
00:27:30Fica bom para mim e fica bom para ele.
00:27:32A satisfação com o esquema atual de parceria não apaga a história de uma vida inteira de preconceito e sofrimento.
00:27:42No passado triste, eu várias vezes fui chicoteado, né?
00:27:46É mesmo?
00:27:47Eu tinha mais ou menos nove anos.
00:27:49Não sei o que eu fiz e eu não era feliz.
00:27:53Na minha realidade, eu preferia não lembrar mais nisso.
00:27:57Porque aí realmente eu sofrer duas vezes, né?
00:28:00Então vamos falar de futuro.
00:28:01É.
00:28:02O que esperar do futuro?
00:28:03Uma vida melhor, né? Aquilo que nossos pais não pôde dar para nós e a gente tentar dar para o nosso filho, né?
00:28:10Que ela pode ter um estudo, que ela pode ser alguém na vida, né?
00:28:16A geração que rompe o ciclo da desigualdade estrutural abre caminho para todas as outras.
00:28:23E é esse o capítulo que com muito atraso começa a ser escrito na novela da vida.
00:28:28O Ivan Santana é hoje um realizado produtor de café especial no município de Cabo Verde, Minas Gerais.
00:28:45A gente conseguiu bater agora, em fevereiro, mais de uma tonelada de café vendido.
00:28:50O que para você...
00:28:51Foi fantástico.
00:28:53Mas ele demorou para fazer as pazes com essa lavoura.
00:28:57Eu tinha ódio do café.
00:28:58Eu tinha sofrido muito, via minha família sofrer muito e não tinha perspectiva nenhuma, né?
00:29:03E tentei de tudo quanto é jeito sair do café.
00:29:05Mas o café parece que me puxava para ele.
00:29:07Filho de trabalhadores rurais, Ivan se formou em técnico agrícola, foi empregado de grandes empresas,
00:29:16até conseguir comprar uma pequena parte da fazenda, onde a família trabalhou por muito tempo.
00:29:22Minha família trabalhou por mais de 30 anos aqui, né?
00:29:25Na lavoura.
00:29:26Eu aprendi a plantar café aqui na propriedade com a minha mãe.
00:29:30E aí, na hora do almoço da minha mãe, ela me ensinava a plantar.
00:29:32E hoje, a gente tem um contrato de que é de propriedade nossa.
00:29:36E já está paga?
00:29:37Já está paga.
00:29:38A gente juntou todo esse dinheiro e adquiriu esses sete hectares de café.
00:29:42Pode falar por quanto?
00:29:43Na época foi por 240 mil.
00:29:47Isso foi em 2015.
00:29:48Ô Ivan, e pensar que lá atrás, na época da escravidão, quando um negro tinha um papel, era a carta de alforria.
00:29:56Sim.
00:29:57E hoje, é um documento de aquisição de uma propriedade, né?
00:30:00É o momento de reescrever a história do negro, né?
00:30:05Uma história de vitórias, de superação.
00:30:08Como a sua?
00:30:08Com a minha.
00:30:10Tem muita história bonita, né?
00:30:11Muita história de conquista, né?
00:30:15É que o café especial tem lá suas características para ganhar as xícaras pelo mundo.
00:30:21A gente fala muito que é um café além do café, né?
00:30:23É um café que traz muitas notas sensoriais, frambuesa, morango, é uma acidez brilhante, um corpo cremoso.
00:30:31Um café muito doce.
00:30:32Olha, eu não sei se eu tenho paladar para tudo isso, mas que é chique, eu estou achando.
00:30:39Bem gostoso, viu gente?
00:30:41É um final feliz?
00:30:42É um final mais que feliz, né?
00:30:44É uma realização de sonho, né?
00:30:45Então, tchim, tchim.
00:30:46Da escravidão para a imigração.
00:30:53O Brasil rural que continuou dependente da mão de obra estrangeira.
00:30:58História que também virou assunto de novela.
00:31:07Muitas histórias já foram contadas e muitas ainda tem para se contar.
00:31:12Em cada canto desse chão tem um tesouro de literatura aguardando que alguém venha e escreva.
00:31:35Uma sequência de eventos históricos trouxe uma multidão de europeus para as nossas lavouras.
00:31:41A abolição, a Primeira Guerra Mundial e o estímulo do governo brasileiro
00:31:45abriram as portas do país para uma mão de obra que transformou nossa agricultura.
00:31:51Os imigrantes foram os protagonistas de grandes sucessos da teledramaturgia da Globo.
00:32:02Eles vieram de longe e ainda hoje mantêm suas tradições.
00:32:06Com o fim da escravidão, foi a vez da mão de obra europeia desembarcar por aqui.
00:32:20A história da imigração também é a história da minha própria família.
00:32:26Eu sou bisneto de italianos que vieram da região de Treviso para trabalhar nessa promissora terra chamada Brasil.
00:32:33Hoje eu tenho a dupla cidadania, estão aqui os passaportes,
00:32:37mas eu confesso que a minha busca por esse documento aqui
00:32:41só começou quando uma certa novela estava no ar.
00:32:45Quem não se lembra desse casal romântico?
00:32:55Dessa música?
00:32:59Dessa alegria?
00:33:01É, foi terra nostra que despertou o meu interesse
00:33:10para conhecer os caminhos dos meus antepassados.
00:33:13O fluxo maior da imigração ocorreu do final do século XIX
00:33:18à primeira metade do século XX.
00:33:21Logo após a Primeira Guerra Mundial,
00:33:24com muitos países devastados e a pobreza se impondo,
00:33:28o Brasil se tornou um destino desejado.
00:33:32Chegamos!
00:33:33Atravessando essa porteira,
00:33:34vocês vão estar entrando no futuro de cada um de vocês.
00:33:39Os italianos foram a maioria
00:33:42dos mais de 4 milhões e 800 mil imigrantes
00:33:46que vieram para cá,
00:33:47atraídos pelo trabalho nas lavouras
00:33:50e pelas políticas públicas
00:33:52que facilitaram o acesso à terra
00:33:53depois da abolição da escravidão.
00:33:56As pessoas chegavam aqui
00:33:58primeiro de carroça,
00:34:01daí tinham que abrir a estrada
00:34:02para chegar até onde ele ia morar,
00:34:05aí tinham que abrir a clareira
00:34:07para poder fazer a casa
00:34:08e depois abrir o mato
00:34:11para poder fazer as roças.
00:34:12O Brasil hoje é um dos maiores
00:34:14produtores mundiais de alimento,
00:34:17não por causa de
00:34:19uma descendência europeia,
00:34:21mas por causa de todo esse conjunto
00:34:24que é o Brasil hoje.
00:34:25Seu Agel, nós estamos aqui hoje
00:34:27comemorando os 60 anos da TV Globo.
00:34:31Muito já se falou de imigração
00:34:32nas novelas, por aí,
00:34:35e muito ainda tem para se falar?
00:34:37Muito.
00:34:38Em cada canto desse chão
00:34:40tem um tesouro
00:34:41de literatura
00:34:43aguardando que alguém
00:34:45venha e escreva.
00:34:47História familiar,
00:34:48história de superação,
00:34:50história de heroísmo,
00:34:51história de bravura.
00:34:52Esse é o povo brasileiro.
00:34:58Um povo misturado,
00:35:01mesmo que só entre os descendentes
00:35:03de europeus.
00:35:04Aqui mora um descendente de italiano,
00:35:06uma descendente de alemão.
00:35:08E a mistura de italiano
00:35:09com alemão dá o quê?
00:35:11Amor.
00:35:11É, o amor se espalhou
00:35:16até na sala de ordenha.
00:35:18A gente se encontrou na comunidade
00:35:21e tuborulando um encontro
00:35:23e temos um ponto até hoje.
00:35:24É, quem olhou primeiro?
00:35:27Ele era bem tímido.
00:35:29Eu passava, cumprimentava ele,
00:35:31olhava assim, oi, assim,
00:35:32o canto de zóia.
00:35:34Chamei na conversa.
00:35:35Deu certo?
00:35:36Deu certo.
00:35:36Vai fazer 15 anos.
00:35:37Mas uma coisa é certa, né?
00:35:41Os antepassados vieram
00:35:43para trabalhar na roça
00:35:44e vocês continuam até hoje.
00:35:46É isso, eu acho que
00:35:47está até no sangue, eu acho.
00:35:48É uma herança que a gente
00:35:49vem trazendo, né?
00:35:51E daí a gente optou
00:35:52por essa vida aqui, né?
00:35:54E eu acho
00:35:55muito boa para esse sinal.
00:35:57No roteiro da vida real,
00:36:01laços se formam,
00:36:03laços se perdem.
00:36:05A gente tem pouca lembrança, né?
00:36:07Nem meu avô, por parte do pai,
00:36:09eu conheci.
00:36:10O senhor não sabe nem de que região
00:36:12da Alemanha a família do senhor vem?
00:36:15Não, não sei.
00:36:17A gente tem pouco conhecimento
00:36:19da história.
00:36:20Essa é uma realidade
00:36:21de muitos imigrantes, né?
00:36:23Porque as famílias vão saindo
00:36:25das suas terras
00:36:26e quem ficou
00:36:28fica para trás, praticamente.
00:36:31Verdade, essa é a triste realidade.
00:36:33É um abraço de tchau,
00:36:35de adeus.
00:36:36É verdade.
00:36:37E não tem mais contato.
00:36:38Exatamente.
00:36:40As famílias eram muito pobres,
00:36:41muito carentes.
00:36:44Com muito trabalho,
00:36:46a carência se transformou
00:36:47em fartura,
00:36:48na mesa e nos negócios.
00:36:53Foi pelas mãos desses agricultores
00:36:55da reforma agrária
00:36:56que nasceu
00:36:57uma das mais importantes
00:36:59cooperativas do oeste
00:37:00de Santa Catarina.
00:37:03Que hoje recolhe leite
00:37:05em 1.500 propriedades
00:37:07em 80 municípios.
00:37:11Essa fábrica
00:37:12tem capacidade
00:37:13para receber
00:37:14800 mil litros por dia.
00:37:17A gente começou
00:37:17sabendo produzir, né?
00:37:19Então a gente só produzia.
00:37:20A gente não sabia industrializar
00:37:21e nem comercializar.
00:37:23Então esse foi um desafio,
00:37:24esses dois pontos.
00:37:25O cooperativismo
00:37:26também é uma herança
00:37:28que muitos desses imigrantes
00:37:30trouxeram na bagagem.
00:37:32Foram eles
00:37:32os responsáveis
00:37:33pelas primeiras cooperativas
00:37:35agrícolas no Brasil.
00:37:37E tudo isso aqui
00:37:38é uma conquista
00:37:39dos imigrantes
00:37:41e também já
00:37:42da miscigenação
00:37:44dos nativos, né?
00:37:46O senhor mesmo
00:37:47é filho de que povo?
00:37:49Eu sou uma mistura, né?
00:37:50Eu digo assim,
00:37:51meu pai tem uma...
00:37:52Veio os avós,
00:37:53os pais dos meus pais
00:37:54vieram, são alemãs, né?
00:37:56Vieram da Alemanha.
00:37:57E a minha mãe
00:37:58era, vamos dizer assim,
00:37:59é nativa, né?
00:38:00Indígena.
00:38:01Indígena.
00:38:01Eu digo que eu sou um brasileiro.
00:38:05Nessa onda
00:38:06de imigrantes europeus
00:38:08que vieram para o Brasil,
00:38:09os romenos
00:38:10também tiveram
00:38:11um importante papel
00:38:12no desenvolvimento
00:38:13da agricultura
00:38:14de Santa Catarina.
00:38:15E de tão organizados,
00:38:17eles conseguiram
00:38:18um feito mundial.
00:38:20Instalaram
00:38:21o único consulado
00:38:22da Romênia
00:38:23fora dos grandes
00:38:24centros urbanos.
00:38:26E fica aqui,
00:38:27no município
00:38:28de Iporã do Oeste.
00:38:30Você já ouviu
00:38:30falar desse lugar?
00:38:34Nós somos honrados
00:38:35em ter um consulado
00:38:36aqui na nossa cidade
00:38:38para poder atender
00:38:39essa região.
00:38:40Uma região
00:38:40do extremo oeste
00:38:42do estado
00:38:42que em cinco municípios
00:38:44concentra pelo menos
00:38:46dez mil descendentes
00:38:48de romenos.
00:38:49Muitos deles
00:38:50já estão
00:38:51com a dupla
00:38:52cidadania reconhecida
00:38:53e até com o passaporte
00:38:55das terras
00:38:56que nem conheceram.
00:38:58Lá é um território
00:38:59de planícies
00:39:00sem pedras,
00:39:02cartera negra,
00:39:03extremamente fértil.
00:39:05Aqui chegaram
00:39:05era bem diferente, né?
00:39:06Um território
00:39:07totalmente diferente.
00:39:08Totalmente diferente.
00:39:09É calor.
00:39:10Eles tiveram que
00:39:11reaprender
00:39:12a ser agricultor aqui.
00:39:13Então foram
00:39:14uma, duas gerações
00:39:15que se sacrificaram
00:39:17em prol
00:39:17das próximas
00:39:19para que pudesse ter
00:39:20o que vocês podem
00:39:21enxergar hoje
00:39:22aqui nessa região.
00:39:23Mas foi com muito trabalho,
00:39:24com muito sacrifício
00:39:25desses primeiros imigrantes.
00:39:32Os tempos passaram
00:39:33e o vento soprou
00:39:35como as águas cristalinas
00:39:37que os nossos antepassados
00:39:40arriscaram de atravessar.
00:39:42Seu Nicodemus Miller
00:39:46e sua esposa Rufina
00:39:48são os últimos imigrantes
00:39:50nascidos na Romênia.
00:39:52A senhora está com quantos anos?
00:39:5390 aí?
00:39:5497.
00:39:55E sete.
00:39:56O senhor?
00:39:5796.
00:39:58E sobre a Romênia?
00:39:59O senhor sabe alguma coisa?
00:40:00Não, eu fico com seis meses, né?
00:40:02Não, não.
00:40:03Atravéssia o mar dormindo.
00:40:04Aqui no Brasil,
00:40:05eles tiveram 13 filhos,
00:40:08formaram todos com a lida
00:40:09no gado de leite,
00:40:11tudo contado no livro
00:40:13de memórias da família
00:40:14de autoria do seu Nicodemus.
00:40:16E essa é uma história
00:40:18mais bonita
00:40:19ou mais triste?
00:40:21Para mim,
00:40:22a história é mais bonita
00:40:23que nós formamos uma família,
00:40:24nós casamos.
00:40:25Só que eu me lembro
00:40:26que me dói.
00:40:28Muitas vezes
00:40:28o coração bate forte
00:40:30porque era triste
00:40:31naquela época, né?
00:40:32Eu só sei que, primeiramente,
00:40:34a minha mãe
00:40:34tinha muita saudade lá.
00:40:36E isso está no livro
00:40:37do senhor?
00:40:38Claro,
00:40:38até o registrado.
00:40:43Da nossa comunidade,
00:40:44ninguém voltou,
00:40:46ninguém retornou
00:40:47para abraçar seus pais,
00:40:49para abraçar seus tios,
00:40:51seus sobrinhos,
00:40:53o que ficou, ficou.
00:40:55E os romanos
00:40:56vieram nessa época
00:40:57para o sul do Brasil
00:40:59à procura de um lar,
00:41:01à procura de uma terra,
00:41:03um pedacinho de chão
00:41:04onde eles pudessem ter
00:41:05uma perspectiva
00:41:06de vida melhor,
00:41:07onde eles pudessem
00:41:08criar as suas famílias.
00:41:12A Rede Globo
00:41:13passou uma novela
00:41:14dos italianos.
00:41:15A gente se sentiu
00:41:16partícipe dessa história
00:41:18porque os navios
00:41:20eram os mesmos.
00:41:21O período
00:41:22dessa navegação
00:41:23foi o mesmo.
00:41:24Era a nossa história.
00:41:26Então,
00:41:26a história da imigração
00:41:27de outras etnias
00:41:29também é a nossa história.
00:41:34Um enredo
00:41:36com tantos pontos
00:41:37em comum
00:41:38que faz a coincidência
00:41:39não ser
00:41:40mera semelhança.
00:41:42O meu pai
00:41:42contava as histórias
00:41:43do avô,
00:41:44que eles já gostavam
00:41:45de suínas lá
00:41:46no país deles,
00:41:47lá na Romênia mesmo.
00:41:49E aí,
00:41:49hoje está passando
00:41:50esse conhecimento
00:41:51para a filha também?
00:41:52Sim,
00:41:53com certeza.
00:41:54Hoje já está
00:41:55praticamente invertido.
00:41:56Eu que trabalho
00:41:57com a filha
00:41:57porque ela já sabe
00:41:58mais dos dados
00:41:59do lote
00:41:59do que o próprio pai.
00:42:01Então,
00:42:02hoje eu já me considero
00:42:03funcionário dela.
00:42:04mas me ajuda
00:42:07nas coisas
00:42:07que eu não consigo fazer
00:42:08no trabalho
00:42:09que é um pouquinho
00:42:09mais pesado.
00:42:10Você tem quantos anos?
00:42:11Tenho 22 anos.
00:42:12O meu plano
00:42:13no princípio
00:42:13é ficar aqui
00:42:14e continuar com o negócio
00:42:15e futuramente
00:42:16quem sabe expandir mais.
00:42:18Olha,
00:42:19Vanessa,
00:42:19a depender
00:42:20do que aconteceu
00:42:21com o pessoal
00:42:22da cooperativa de leite,
00:42:23o seu desejo
00:42:24é só uma questão
00:42:26de tempo,
00:42:26viu?
00:42:27Nada começa,
00:42:28pronto.
00:42:29Foi um desafio
00:42:29muito grande.
00:42:30Seus antepassados
00:42:32sentiriam orgulho
00:42:33de ver
00:42:34o que foi construído
00:42:35aqui no Brasil.
00:42:36Acredito que sim.
00:42:37E a gente está fazendo
00:42:38isso em homenagem
00:42:40a eles também.
00:42:41Parabéns.
00:42:42Parabéns.
00:42:46E já, já.
00:42:49Um encontro
00:42:50entre dois universos
00:42:51distintos,
00:42:52ficção
00:42:52e realidade.
00:42:54Quanto tempo!
00:42:55Eu pude ver
00:42:56que milagres acontecem.
00:42:57Na continuação
00:43:09da nossa reportagem especial,
00:43:11o encontro
00:43:12de dois mundos
00:43:13distintos,
00:43:14ficção
00:43:15e realidade.
00:43:16Na verdade,
00:43:17são reencontros.
00:43:20Sua vez,
00:43:20Ellen.
00:43:21É isso mesmo,
00:43:22Nelson.
00:43:22Eu assumo agora
00:43:23a contação de história
00:43:24para mostrar
00:43:25a produtora
00:43:26que se reconheceu
00:43:27na personagem
00:43:27da novela
00:43:28e o ator
00:43:29que se inspirou
00:43:30na vida real
00:43:31de um agricultor.
00:43:36Tem tratorista
00:43:37nova no campo.
00:43:38Faz tempo que você
00:43:43pilota trator assim?
00:43:44Tem quase três anos.
00:43:46E sempre aqui
00:43:47nessa propriedade?
00:43:48É, olha,
00:43:49comecei lá
00:43:49no Mato Grosso do Sul.
00:43:51E a diária
00:43:51de tratorista
00:43:52é boa?
00:43:53É boa,
00:43:53é boa,
00:43:54mas pode ser
00:43:55de melhorar.
00:43:58Gente,
00:43:58a Bárbara Reis
00:43:59é a Pris
00:44:00e foi ela
00:44:01que deu vida
00:44:01à personagem Aline
00:44:03da novela
00:44:04Terra e Paixão.
00:44:05Ela era essa mulher,
00:44:07né?
00:44:07Não sabia lidar
00:44:08com a Terra,
00:44:09era professora
00:44:10de matemática,
00:44:11mas se viu
00:44:11no meio
00:44:12dessa encruzilhada
00:44:14e eu falei assim,
00:44:14agora eu vou ter
00:44:15que botar a mão
00:44:15na massa,
00:44:16agora eu vou
00:44:16plantar soja,
00:44:18vou plantar milho
00:44:19para poder também
00:44:20ter o domínio
00:44:20do negócio dela.
00:44:23É milho
00:44:24nascendo,
00:44:24Jônatas.
00:44:25É.
00:44:26Agora eu sinto
00:44:26que eu vou vencer.
00:44:29Um negócio
00:44:30que a personagem
00:44:30herdou com a morte
00:44:32do marido.
00:44:33O universo
00:44:34da produção rural
00:44:35era um desconhecido
00:44:36para a atriz
00:44:37nascida
00:44:37na cidade
00:44:38do Rio de Janeiro.
00:44:39Silo de armazenamento,
00:44:40achava que era,
00:44:41sei lá,
00:44:41um pequeno galpão,
00:44:43uma coisa ali,
00:44:44mas são estruturas
00:44:45gigantescas, né?
00:44:48Parecem prédios
00:44:49assim de 30 andares.
00:44:51O cenário de hoje
00:44:53é uma fazenda
00:44:54em Jaguariú,
00:44:55na São Paulo.
00:44:56Não tem produção
00:44:57de grãos
00:44:57como a da novela.
00:44:59Aqui são plantas
00:45:00ornamentais
00:45:00e os produtos.
00:45:02Jônatas,
00:45:03quanto tempo!
00:45:05Prazer.
00:45:06Bárbara e a dona
00:45:07da fazenda
00:45:08se conheceram
00:45:09graças à novela.
00:45:10Eu estava
00:45:11num ensaio
00:45:12de fotos
00:45:13na casa dela
00:45:14em São Paulo
00:45:15e ela pegou
00:45:16e virou para mim
00:45:18e contou
00:45:18a história
00:45:19da vida dela
00:45:19dizendo que
00:45:20era muito parecida
00:45:21com a história
00:45:22da Aline.
00:45:23Falei para você
00:45:23que ela tornou
00:45:24uma grande
00:45:24produtora rural.
00:45:26Eu me senti tocada
00:45:27porque ela vivia
00:45:28na ficção
00:45:30o que eu vivo
00:45:31na vida
00:45:32como ela é,
00:45:33na real.
00:45:34Renata assumiu
00:45:35a propriedade
00:45:35em 2020
00:45:36com a morte do pai
00:45:38e era difícil
00:45:39ser uma mulher
00:45:40no meio rural?
00:45:41É muito difícil.
00:45:43Eu fui boicotada
00:45:44e não foi pouco,
00:45:46mas não desisti
00:45:47porque eu quis
00:45:48dar continuidade
00:45:49à história
00:45:49da minha família.
00:45:51E a mesma motivação
00:45:52da Aline, né?
00:45:52Ela queria manter
00:45:53o legado
00:45:54do marido.
00:45:56Via ali realmente
00:45:57uma potência
00:45:58de prosperar.
00:46:01E a prosperidade
00:46:02aos poucos
00:46:03vem chegando
00:46:03também para Renata.
00:46:05Depois de modernizar
00:46:06o negócio,
00:46:07produção e vendas
00:46:08se recuperaram.
00:46:10Tem desde
00:46:10delicadas plantas
00:46:12ornamentais
00:46:12até árvores grandes.
00:46:15Aqui antes
00:46:16era um pasto.
00:46:17O pai da Renata
00:46:18começou um cultivo
00:46:19de plantas exóticas
00:46:20e com o tempo
00:46:21a natureza
00:46:22preencheu
00:46:23com plantas nativas.
00:46:25Para tornar
00:46:26a paisagem
00:46:27realmente
00:46:28uma verdade,
00:46:30você tem que usar
00:46:30plantas nativas.
00:46:32Uma verdade
00:46:33criada,
00:46:34construída
00:46:35com elementos
00:46:35diferentes.
00:46:37É quase que
00:46:37uma novela
00:46:38com personagens
00:46:39simulando
00:46:40a vida real.
00:46:41E tem gente
00:46:42bem noveleira
00:46:43por aqui, viu?
00:46:44Estou sentindo
00:46:45um cheirinho
00:46:46aqui de fora.
00:46:47O que você está
00:46:48fazendo aí
00:46:48para a gente?
00:46:49Eu não acredito.
00:46:50Você aqui
00:46:52na minha cozinha
00:46:53é uma mentira.
00:46:54Olha,
00:46:54eu fiquei sabendo
00:46:55de dizer
00:46:56que você é uma
00:46:57noveleira.
00:46:58Então,
00:46:59você se identifica
00:47:00com a linha
00:47:00em algum aspecto?
00:47:02Não sou eu
00:47:03como todas as mulheres,
00:47:04né?
00:47:06A parte que você
00:47:07está lá
00:47:07que você olha
00:47:08sempre
00:47:08eu vou plantar
00:47:10e vou colher.
00:47:11Eu vou aprender
00:47:12a plantar,
00:47:13a colher,
00:47:14a frutificar.
00:47:15Sabe com o que
00:47:18que pareceu?
00:47:20O vento levou.
00:47:21Olha!
00:47:22Olha isso!
00:47:24De referência,
00:47:25mas era isso mesmo!
00:47:31Maravilhosa,
00:47:31Regina,
00:47:32maravilhosa!
00:47:33Exatamente
00:47:33essa referência.
00:47:34Era de casa
00:47:34de Ohara.
00:47:35Eu nunca mais
00:47:35passarei fome.
00:47:36Eu nunca vou
00:47:37ficar hungry again.
00:47:39Não,
00:47:39não é minha culpa.
00:47:41E não pense
00:47:42que só
00:47:43a mulher
00:47:43é noveleira,
00:47:44não.
00:47:44tem mais gente
00:47:45se sentindo
00:47:46representada.
00:47:47É uma novela
00:47:48que ela já vai
00:47:49buscar a essência
00:47:51do caipira
00:47:51lá na rosa.
00:47:53Então eu não tenho
00:47:53o que dizer.
00:47:54É o que eu
00:47:55vivo aqui.
00:47:57Rosa!
00:47:58Terra!
00:47:59Terra não!
00:47:59O amor pela terra
00:48:03faz brilhar
00:48:03os olhos também
00:48:04de quem vive
00:48:05neste assentamento,
00:48:07Porto Guarani.
00:48:08Ele fica
00:48:09na região
00:48:09de Ribeirão Preto
00:48:10e foi cenário
00:48:12da novela
00:48:12Rei do Gado.
00:48:13O trato
00:48:14que eu fiz
00:48:15com o dono
00:48:15daquelas terras
00:48:16foi que vocês
00:48:17vão entrar lá
00:48:18em ordem.
00:48:19Na época,
00:48:20em 96,
00:48:21o que existia
00:48:22aqui era
00:48:22um acampamento.
00:48:24Hoje,
00:48:25300 famílias
00:48:26já estão
00:48:27assentadas.
00:48:28Mas há cerca
00:48:28de 10 anos,
00:48:30outras 70
00:48:31novas famílias
00:48:32ocuparam
00:48:33uma área
00:48:34dentro do
00:48:34assentamento
00:48:35e continuam
00:48:36acampadas,
00:48:37vivendo em moradias
00:48:38precárias,
00:48:39num calor que
00:48:40às vezes supera
00:48:41uns 40 graus.
00:48:44Seu Zé
00:48:45mantém um pequeno
00:48:46bar na frente
00:48:47do barraco
00:48:48que nos leva
00:48:48para conhecer.
00:48:49Aqui é o único
00:48:50que eu descanso,
00:48:52aqui é o único
00:48:52que eu falo
00:48:52do meu comezinho.
00:48:54É desconfortado.
00:48:55A gente vive assim
00:48:56porque a gente gosta
00:48:58de cultivar,
00:49:00gosta de ficar
00:49:00na roça,
00:49:01a gente sofre
00:49:02um pouquinho
00:49:02com o calor.
00:49:03O tema
00:49:07na época
00:49:09da novela
00:49:09foi importante,
00:49:11levou para a sociedade
00:49:12essas dificuldades
00:49:13que é o acampamento,
00:49:14essas famílias
00:49:15na luta pela terra
00:49:16e hoje
00:49:17a gente ainda
00:49:19continua
00:49:19com essa mesma
00:49:20discussão
00:49:20depois de 30 anos
00:49:22da novela.
00:49:23Valdir hoje
00:49:24já tem seu sítio,
00:49:26mas com 15 anos
00:49:27foi um dos vários
00:49:28acampados
00:49:29que viraram
00:49:30figurantes
00:49:30na novela.
00:49:32Olha ele aí.
00:49:32Isso nunca tinha
00:49:33acontecido antes, gente.
00:49:36Outro sítio
00:49:37que vamos visitar
00:49:38agora
00:49:39serviu de laboratório
00:49:40para os atores
00:49:41de Rei do Gado.
00:49:44Hoje
00:49:45a principal renda
00:49:46da família
00:49:47vem da banana.
00:49:50Eu estou ampliando
00:49:51o meu bananeral.
00:49:52O que tem aqui
00:49:53já está começando
00:49:54a ser pouco.
00:49:55O verde
00:49:56ao redor da casa
00:49:57foi obra
00:49:57da vandira,
00:49:58mulher do ladeira.
00:50:00Meu pai
00:50:01sempre tinha
00:50:01uma semente
00:50:02no bolso
00:50:03e eu também
00:50:04tenho sempre
00:50:05esse costume.
00:50:06Na cozinha
00:50:07vou colhendo,
00:50:08vou separando
00:50:09a semente.
00:50:11Junto com o marido
00:50:12e a filha mais nova,
00:50:14Vandira
00:50:14trabalha
00:50:15para recuperar
00:50:16a mata ciliar.
00:50:17A gente precisa
00:50:21tomar consciência
00:50:22porque se esse rio
00:50:24não serviu,
00:50:24agora a gente tem
00:50:25que fazer com que
00:50:26ele não morra.
00:50:28Amo esse lugar aqui.
00:50:29Tinha os lambareios
00:50:30que a gente pescava,
00:50:31a gente nadava
00:50:32no rio.
00:50:33Era bem gostoso.
00:50:35Nas fotos antigas,
00:50:36mais lembranças.
00:50:38O barraco
00:50:38onde moravam,
00:50:39o banheiro
00:50:40improvisado.
00:50:41Era aqui.
00:50:42É,
00:50:42de madeira
00:50:43na lateral
00:50:44e coberto
00:50:45de lona.
00:50:45Que tamanho tinha?
00:50:474 por 4.
00:50:49E moravam
00:50:49quantas pessoas?
00:50:504.
00:50:52Foram 6 anos
00:50:53de espera
00:50:54pelo assentamento
00:50:55nos lotes
00:50:55que ocupam hoje.
00:50:57Depois disso
00:50:57veio uma casa
00:50:58simples de alvenaria
00:51:00que hoje
00:51:01está bem diferente.
00:51:03A casa foi reformada
00:51:04há pouco tempo,
00:51:05em 2023.
00:51:07E agora,
00:51:07olha só,
00:51:08tem até
00:51:09quarto de hóspedes.
00:51:10Tem um outro quarto aqui.
00:51:12De 4 por 4
00:51:13passou pra quantos metros?
00:51:15120 metros quadrados.
00:51:17120?
00:51:18Quantos quartos tem?
00:51:19Tem 4 quartos.
00:51:21E uma sala
00:51:22com ar-condicionado
00:51:23e tudo isso?
00:51:24É uma sala
00:51:24com ar-condicionado.
00:51:27Foi com a renda
00:51:28da terra
00:51:29e a ajuda
00:51:29das filhas
00:51:30que trabalham fora
00:51:31que a família
00:51:32conseguiu
00:51:32esse conforto.
00:51:34Melissa,
00:51:34filha mais velha,
00:51:35lembra que antes
00:51:36não havia água encanada
00:51:38nem energia elétrica
00:51:39que permitisse
00:51:40ter uma geladeira
00:51:42ou uma televisão.
00:51:43Foi com o dinheirinho
00:51:45que a gente ganhou
00:51:45da novela
00:51:46que meu pai comprou
00:51:47uma televisãozinha
00:51:48à bateria
00:51:48porque na época
00:51:49não tinha energia elétrica
00:51:51pra gente acompanhar
00:51:52um pouquinho.
00:51:53Mas foi com o dinheiro
00:51:54que a gente ganhou
00:51:55na figuração da novela.
00:51:56Ladeira era um dos figurantes
00:51:59com maior destaque
00:52:00quase sempre ao lado
00:52:02do ator Jackson Antunes
00:52:03que fazia o papel
00:52:05de Regino
00:52:06líder do Sem Terra.
00:52:08Vocês vão entrar lá
00:52:09em paz!
00:52:10Em paz!
00:52:13O que eles não sabem
00:52:14é que a gente preparou
00:52:15uma surpresa
00:52:16pra família
00:52:17a visita
00:52:18de um velho conhecido
00:52:19o Regino
00:52:20o ator Jackson Antunes.
00:52:22Tá animado?
00:52:23Eu tô muito animado.
00:52:24Faz tempo que você
00:52:25não vê o povo lá, né?
00:52:25Ah, já tem um bom tempo.
00:52:27Mais de 30 anos,
00:52:27eu acho, né?
00:52:28E trouxe até a viola?
00:52:29Trouxe, porque a viola
00:52:30é aquele instrumento
00:52:31que marca os reencontros, né?
00:52:32Vai ter trilha sonora, hein, gente?
00:52:34Até mais!
00:52:35Vou lá, até mais!
00:52:42Enquanto Jackson
00:52:43não chega ao sítio
00:52:44conversa sobre o convívio
00:52:46entre dois mundos
00:52:47tão diferentes
00:52:48atores e trabalhadores
00:52:50do campo.
00:52:51Na época
00:52:52eu era considerado
00:52:54aqui como líder
00:52:55do movimento.
00:52:56Você era o Regino
00:52:57da novela.
00:52:58Isso!
00:53:04Nós andamos aqui
00:53:05dentro do assentamento
00:53:06pra eles conhecerem
00:53:08as pessoas também
00:53:09e também
00:53:10ter uma experiência
00:53:11como era o Sem Terra
00:53:13porque eles iam fazer
00:53:14o papel do Sem Terra.
00:53:16Quando eles chegaram aqui,
00:53:17Vandira,
00:53:18qual foi a reação deles?
00:53:19Ah, eu achei assim
00:53:20que eles ficaram bastante
00:53:21consternados, né,
00:53:23com a situação.
00:53:24Era tudo muito improvisado.
00:53:26E vocês acham
00:53:27que vocês foram
00:53:27bem representados
00:53:28naquela época?
00:53:30Sim.
00:53:30Eles vieram aqui
00:53:31ficar aqui uns dias
00:53:33pra poder conhecer
00:53:34como nós vivíamos,
00:53:37como era o trabalho
00:53:38nosso aqui no assentamento.
00:53:40E eles voltaram aí,
00:53:41ó, um voltou.
00:53:42Jadson.
00:53:45Aí, aí, aí.
00:53:50Mas você tá um menino?
00:53:54É, tá do mesmo jeitinho
00:53:56que eu lhe vi.
00:53:57Quantos tempos.
00:53:58Quantos tempos.
00:54:01Nossa.
00:54:02É emocionante, né?
00:54:04Mudou aqui.
00:54:06Eu sei.
00:54:08Mas naquele tempo
00:54:09eu não tinha dúvida
00:54:10que você ia fazer.
00:54:10você e a turma
00:54:11e eu fazer isso mudar.
00:54:13Eu senti uma força
00:54:13na cara das pessoas.
00:54:20O meu pai foi sem terra.
00:54:22Todos os meus tios também
00:54:24foram sem terra.
00:54:25E eu vivi esse personagem
00:54:27de uma forma muito intensa
00:54:28em homenagem
00:54:29às pessoas que eu conhecia.
00:54:31Eu acho que a televisão,
00:54:32quando pega o seu papel
00:54:33de função social,
00:54:35de abrir os olhos
00:54:37da pessoa
00:54:37pra o que é essa realidade,
00:54:38realidade que não é muito vista
00:54:40ali no dia a dia, né?
00:54:41É muito importante.
00:54:42Se o sujeito é o rei do gado,
00:54:44então cadê o boi dele?
00:54:47A gente só tá vendo
00:54:48os passos vazios?
00:54:49Surpresa, Lago.
00:54:50Nossa.
00:54:52Conseguimos esconder bem?
00:54:53Quando deu, nossa,
00:54:55eu nem imaginava.
00:54:57Nem imaginava.
00:54:58E a partir da novela
00:55:00que mudou a nossa imagem
00:55:02diante da sociedade.
00:55:05A gente só queria um pedaço
00:55:06de terra
00:55:06pra poder morar,
00:55:08plantar,
00:55:09criar os nossos filhos.
00:55:10E os filhos cresceram.
00:55:12Das fotos da época
00:55:14da gravação
00:55:14pra hoje.
00:55:15Trazer em revelo.
00:55:19Não vai dar pra pegar
00:55:20no colo, não, né, Jax?
00:55:22Eu cresci um pouquinho.
00:55:23Cresci um pouquinho.
00:55:25E Ladeire Vandir
00:55:26agora já tem filho
00:55:27que nasceu depois
00:55:28e até neto.
00:55:30Lorenzo.
00:55:30Pergunta qual é o nome dele.
00:55:31Lorenzo.
00:55:32E você?
00:55:33Jackson.
00:55:33Jackson.
00:55:33Eu sou a todos
00:55:34e vulgo é gente.
00:55:36Apresentada a família,
00:55:37é hora de circular
00:55:38pelo sítio
00:55:39pra ver as mudanças.
00:55:41O Bananal.
00:55:42O dia que a gente
00:55:43não tem nada
00:55:44a gente tem banana,
00:55:45tem mandioca,
00:55:46tem frango.
00:55:46Olha pra você ver.
00:55:46Tem tudo, tem quiabo.
00:55:48O dia que não tem nada
00:55:49tem mandioca,
00:55:49tem frango,
00:55:50tem banana.
00:55:51O plantio de amendoim.
00:55:53Você usa nada ainda?
00:55:55Não, isso aqui é
00:55:56tudo mecanizado.
00:55:57Desculpa,
00:55:58eu voltei há 35 anos atrás.
00:56:00A igreja ao lado do sítio
00:56:02e, claro,
00:56:03a casa nova.
00:56:04Vou até tirar o meu chapéu
00:56:05pra entrar.
00:56:07Eu quero conhecer um lugar
00:56:08que às vezes
00:56:08tinha dois locais
00:56:10que eu ia
00:56:10e você
00:56:11sempre me acompanhar
00:56:12e falava
00:56:13desculpa,
00:56:13seu Jacques,
00:56:14desculpa,
00:56:14seu Jacques,
00:56:15desculpa.
00:56:16Quero o banheiro
00:56:17e o quarto.
00:56:18Certo,
00:56:18toda.
00:56:19Vou deitadinha aqui
00:56:20pro banheiro
00:56:22e eu vou botar
00:56:22o meu chapéu.
00:56:24Naquela época
00:56:25do banheiro
00:56:26que você conheceu
00:56:27hoje.
00:56:27Paz,
00:56:28olha aqui.
00:56:29Deu uma melhoradinha,
00:56:31né?
00:56:31Que maravilha.
00:56:31Não, tá lindo,
00:56:32tá lindo.
00:56:33No almoço,
00:56:41a fartura
00:56:41que Jackson
00:56:42nunca duvidou
00:56:43de ver por aqui.
00:56:45Por isso que hoje
00:56:45é o dia mais importante,
00:56:46talvez,
00:56:47da minha vida
00:56:47como ser humano
00:56:49e como ator
00:56:50e como profissional.
00:56:51Porque eu pude ver
00:56:53que milagres acontecem,
00:56:55né?
00:56:55E que isso é muito importante
00:56:56porque tocou João,
00:56:58tocou Antônio
00:56:58e isso partiu
00:56:59de uma ideia
00:57:00de um brasileiro,
00:57:01um autor brasileiro
00:57:02chamado Benedito
00:57:03Rui Barbosa.
00:57:05É,
00:57:06foi Benedito
00:57:06que tornou possível
00:57:08atar esse laço
00:57:09entre ficção
00:57:10e realidade.
00:57:11E tá aí a viola
00:57:13pra celebrar
00:57:13o encontro.
00:57:14E longe
00:57:16eu avistava
00:57:17a figura
00:57:19de um menino
00:57:20e corria
00:57:21da porteira
00:57:23de poesia
00:57:24me pedindo
00:57:25toque o grande
00:57:27seu moço
00:57:28que é pra eu
00:57:29pintar o rio
00:57:31No próximo bloco
00:57:32você vai conhecer melhor
00:57:34este que é o autor
00:57:35que mais retratou
00:57:36o campo brasileiro.
00:57:37Inventei tantas histórias.
00:57:40Até já.
00:57:50Na última parte
00:57:51do nosso programa especial
00:57:53a história
00:57:54de um contador
00:57:55de histórias.
00:57:56Um escritor
00:57:57que ouviu
00:57:58os homens
00:57:59e as mulheres
00:57:59do campo
00:58:00e soube representar
00:58:02suas vidas
00:58:02na telinha.
00:58:04Estamos falando
00:58:04de Benedito
00:58:05Rui Barbosa
00:58:06o autor de novelas
00:58:08que mais retratou
00:58:09esse universo.
00:58:10Ele acaba
00:58:10de completar
00:58:1194 anos
00:58:13e sempre foi
00:58:14um apaixonado
00:58:15pelo mundo rural.
00:58:16Tocar uma boiada
00:58:27incomitível
00:58:28é percorrer
00:58:28caminhos
00:58:29tortosos
00:58:30você sai do ponto
00:58:31de partida
00:58:32sem saber o final
00:58:33no meio
00:58:34umas vagas
00:58:35podem morrer
00:58:36um boi
00:58:36escapar
00:58:37pode ser feito
00:58:38algum desvio
00:58:39mas você precisa
00:58:40seguir com convicção
00:58:42enfrentando
00:58:43do trajeto
00:58:43igual a escrever
00:58:46uma novela.
00:58:49É o que diz
00:58:50o autor
00:58:51Benedito
00:58:51Rui Barbosa
00:58:52que nesse escritório
00:58:53escreveu
00:58:54várias novelas
00:58:55que retratam
00:58:56o universo
00:58:57do homem do campo
00:58:58e da mesa
00:58:59de trabalho
00:58:59ele tinha
00:59:00uma vista
00:59:01inspiradora
00:59:02a do sítio
00:59:03da família
00:59:03que fica
00:59:04em Sorocaba
00:59:05São Paulo.
00:59:09O sítio
00:59:10foi comprado
00:59:10por ele
00:59:11e a mulher
00:59:11Marilene
00:59:12há mais de
00:59:1330 anos
00:59:14é o lugar
00:59:15que o casal
00:59:16projetou
00:59:16para agregar
00:59:17a família
00:59:18Como essa vida
00:59:19de escritor
00:59:20ela é muito
00:59:21solitária
00:59:21eu acho que
00:59:22a contrapartida
00:59:24foi essa
00:59:24foi que
00:59:24o descanso
00:59:25fosse junto
00:59:26Na vida
00:59:26assim com a família
00:59:27ele é um contador
00:59:28de histórias
00:59:28ou elas ficavam
00:59:29só para os roteiros
00:59:30Era o interminável
00:59:31sentava na mesa
00:59:32do almoço
00:59:33só saia na hora
00:59:34do jantar
00:59:34amigos que vinham
00:59:35aqui não podiam levantar
00:59:36quando levantava
00:59:37ele parava
00:59:37fazia um intervalo
00:59:38comercial
00:59:38esperava a pessoa
00:59:39voltar
00:59:40retomava do ponto
00:59:41que ele parou
00:59:42ele é um contador
00:59:43de histórias
00:59:44Nápoles
00:59:44Filha e neto
00:59:46de Benedito
00:59:47Edmara e Bruno
00:59:48também são roteiristas
00:59:50e guardam
00:59:51bons momentos
00:59:52no sítio
00:59:53Aqui é um pedacinho
00:59:54de chão dele
00:59:55é a terra dele
00:59:57foi uma coisa
00:59:58que ele sonhou
00:59:58a vida inteira
00:59:59de voltar a ter
01:00:00Hoje
01:00:01Benedito
01:00:02vive na capital
01:00:03de São Paulo
01:00:04mas nasceu
01:00:05no pequeno
01:00:05município
01:00:06de galha
01:00:07Nasci dentro
01:00:08da fazenda
01:00:08trabalhei
01:00:09eu derrissei
01:00:10café
01:00:11eu bati feijão
01:00:13você tem aqui
01:00:13uma população
01:00:14imensa aqui em São Paulo
01:00:15mas a grande maioria
01:00:17tem barro na sala do pé
01:00:18A nostalgia do campo
01:00:21já estava presente
01:00:22no título
01:00:23da primeira novela
01:00:24exibida na TV Globo
01:00:26e simultaneamente
01:00:27na TV Cultura
01:00:28Meu Pedacinho de Chão
01:00:30Consegui provar
01:00:35que podia se fazer
01:00:36uma novela
01:00:36enfocando
01:00:37uma temática
01:00:38rural brasileira
01:00:39necessária
01:00:41demais
01:00:41O escritório
01:00:43do sítio
01:00:44guarda relíquias
01:00:45que marcam
01:00:45o apreço
01:00:46pelo campo
01:00:47um berrante
01:00:48o famoso
01:00:49marcador de gado
01:00:50da abertura
01:00:51da novela
01:00:52Rei do Gado
01:00:52e os inúmeros
01:00:55prêmios recebidos
01:00:56ao longo
01:00:56dos seus 59
01:00:57anos de ofício
01:00:59Aliás
01:01:00o começo
01:01:00da carreira dele
01:01:01é digno
01:01:02de roteiro
01:01:03de novela
01:01:05Foi um livro
01:01:05igual a esse
01:01:07o responsável
01:01:08pelo surgimento
01:01:09de Benedito
01:01:10Rui Barbosa
01:01:11escritor
01:01:12Quando criança
01:01:13ele pediu
01:01:14de presente
01:01:14uma bicicleta
01:01:16Sem ter dinheiro
01:01:17o pai
01:01:18deu o livro
01:01:19Peter Pan
01:01:20O menino
01:01:20ficou contrariado
01:01:22e jogou o livro
01:01:23no alto de um armário
01:01:24Dias depois
01:01:25aprontou alguma
01:01:26e foi colocado
01:01:27de castigo
01:01:28Sem ter o que fazer
01:01:29resgatou o livro
01:01:31e começou
01:01:32a se distrair
01:01:33Nunca mais
01:01:34abandonou a leitura
01:01:35e com isso
01:01:36veio também
01:01:37a contação
01:01:38de histórias
01:01:38Ele começou
01:01:39a ver o Peter Pan
01:01:41que era um menino
01:01:42que não queria crescer
01:01:43e isso calou
01:01:44muito fundo nele
01:01:45e aí se forma
01:01:46uma roda em volta dele
01:01:47e todo mundo
01:01:48quer ouvir ele contar
01:01:50e aí chega uma hora
01:01:50que acaba
01:01:51aí ele começa
01:01:52a inventar a história
01:01:53Aos 94 anos
01:01:55Benedito guarda
01:01:56a lembrança
01:01:57de como a molecada
01:01:58se divertia
01:01:59com as histórias
01:02:00Adorava
01:02:01Sentava todo mundo
01:02:02e eu contava
01:02:04Cada dia inventava
01:02:05uma
01:02:05Inventei tantas histórias
01:02:09Puta merda
01:02:10Quando eu comecei
01:02:12a escrever novela
01:02:13todo mundo
01:02:14disse a mesma coisa
01:02:15Tinha que ser
01:02:16Aos 12 anos
01:02:18a vida de Benedito
01:02:19sofreu uma grande virada
01:02:21Ele perdeu o pai
01:02:22e sendo mais velho
01:02:24de 5 filhos
01:02:25ao contrário
01:02:26de Peter Pan
01:02:27que se recusava
01:02:28a crescer
01:02:28Benedito teve
01:02:30a sua meninice
01:02:31abreviada
01:02:31Ele sai da terra
01:02:33do louco
01:02:33e precisa cair
01:02:34na vida real
01:02:34Minha avó perdeu tudo
01:02:36perdeu a tipografia
01:02:37perdeu a livraria
01:02:39Minha avó morreu
01:02:40e ela não conseguiu
01:02:41manter nada
01:02:42Com 17
01:02:42ele veio para São Paulo
01:02:43Ele foi na verdade
01:02:44pai de família
01:02:45aos 17 anos
01:02:46pai dos irmãos
01:02:47Foram muitas
01:02:51as homenagens
01:02:51ao pai
01:02:52jornalista
01:02:53e tipógrafo
01:02:54feitas por Benedito
01:02:55em suas novelas
01:02:56Em Pantanal
01:02:57ele foi trazido
01:02:58como o Velho do Rio
01:03:00um guardião
01:03:01espiritual
01:03:01da natureza
01:03:02O Pantanal
01:03:05é uma história
01:03:05muito particular
01:03:06para ele
01:03:07porque eu acho
01:03:07que ela tem um pouco
01:03:07do que ele escreveria
01:03:10se ele fosse Deus
01:03:11da própria vida
01:03:11O encontro dele
01:03:13com o Velho do Rio
01:03:13é o encontro dele
01:03:14com o pai dele
01:03:14que sumiu
01:03:15que ele esperou
01:03:15a vida inteira
01:03:16chegar
01:03:16então acho que
01:03:17é uma coisa
01:03:17de foro
01:03:18muito íntimo
01:03:18dele
01:03:18Levanta
01:03:20filho
01:03:20Antes de ser escritor
01:03:35como pai
01:03:37Benedito
01:03:37foi jornalista
01:03:39uma atividade
01:03:40que acabou
01:03:41por nortear
01:03:42seu trabalho
01:03:42como autor
01:03:43de novela
01:03:44Ele sempre
01:03:45representou
01:03:46o momento social
01:03:47onde a novela
01:03:47estava inserida
01:03:48sabe
01:03:48Ele falou
01:03:54que ele fazia
01:03:54as novelas dele
01:03:55como se fosse
01:03:55uma grande matéria
01:03:56onde no fim
01:03:57das contas
01:03:58aquilo que ele
01:03:58pensa individualmente
01:04:00pouco importa
01:04:01Foi com esse equilíbrio
01:04:05e sem se esquecer
01:04:06do barro
01:04:07na sola
01:04:07do sapato
01:04:08que o escritor
01:04:09tocou em temas
01:04:10espinhosos
01:04:11Em meu pedacinho
01:04:14de chão
01:04:14em plena ditadura
01:04:16o autor
01:04:16foi censurado
01:04:18por mostrar
01:04:18caboclos
01:04:19cantando o hino
01:04:20nacional
01:04:20numa beira
01:04:21de estrada
01:04:22Em terra
01:04:25nostra
01:04:25abordou
01:04:26o racismo
01:04:27Mas há quem
01:04:28diga que
01:04:29nos últimos tempos
01:04:30os negros
01:04:31estavam saindo
01:04:31mais caro
01:04:32do que eles
01:04:32pela indolência
01:04:34pelo desinteresse
01:04:35em fazer
01:04:36uma colheita
01:04:36bem feita
01:04:37e ainda
01:04:38se queixavam
01:04:39dos castigos
01:04:39Em Rei do Gado
01:04:41foi a vez
01:04:42da reforma agrária
01:04:43Então quando você
01:04:45começa a discutir
01:04:45o que é terra devoluta
01:04:46o que não é terra devoluta
01:04:47o direito que o homem
01:04:48tem ao trabalho
01:04:49no campo
01:04:50que a terra
01:04:51não pode ser
01:04:51ficar na mão
01:04:52de meia dúzia
01:04:53tanta terra
01:04:54improdutiva
01:04:55Os sucessos
01:04:56retratando o campo
01:04:57foram muitos
01:04:58Eu acho que quando ele
01:04:59retrata o homem
01:05:00do campo
01:05:01ele faz isso
01:05:02de uma maneira
01:05:02muito
01:05:03as avessas
01:05:04do Jeca Tatu
01:05:04e eu acho que isso
01:05:05faz muito bem
01:05:06isso é muito justo
01:05:06porque quando você vai
01:05:07para o campo
01:05:08você entende
01:05:08as complexidades
01:05:09todas que estão
01:05:10passando naquele ambiente
01:05:11naquele contexto
01:05:12Bruno é autor
01:05:13do remake
01:05:14de dois dos grandes
01:05:15sucessos do avô
01:05:16Renascer
01:05:17e Pantanal
01:05:19novelas que se mantiveram
01:05:22vivas na memória
01:05:23do público
01:05:23mas ao serem
01:05:25revisitadas
01:05:26precisaram se adaptar
01:05:27aos novos tempos
01:05:29Por exemplo
01:05:29o Jove
01:05:30que era um personagem
01:05:31que na cabeça dele
01:05:32era aquele jovem
01:05:34que tinha acabado
01:05:34pegou um Brasil
01:05:35onde pode tudo
01:05:36pós-ditadura
01:05:37então aquele personagem
01:05:38estava muito presente
01:05:39num Brasil
01:05:39que não existe mais
01:05:40o jovem de hoje
01:05:41ele está lidando
01:05:42com uma orgência
01:05:43de um mundo
01:05:43que está enfrentando
01:05:44realidades climáticas
01:05:45que não tinha
01:05:4630 anos atrás
01:05:47então ele tem que lidar
01:05:47com a questão
01:05:48do meio ambiente
01:05:48que ele é filho
01:05:49de um pecuarista
01:05:49no discurso
01:05:50é muito bonito
01:05:51mas não se sustenta
01:05:53fora do papel não
01:05:54filho
01:05:54vai produzir
01:05:57que for não sustentável
01:05:57é a única saída
01:05:58cara
01:05:59o cuidado com a natureza
01:06:01é presente
01:06:02na obra de Benedito
01:06:03e na de seus herdeiros
01:06:04na escrita
01:06:05e transborda
01:06:06para a vida
01:06:07no sítio
01:06:08realidade e ficção
01:06:10se entrelaçam
01:06:11o cultivo nessa área
01:06:13existe há apenas
01:06:143 anos
01:06:15aqui era um terreno
01:06:16meio seco
01:06:17que estava sofrendo
01:06:18com a erosão
01:06:19e esse problema
01:06:20poderia ter sido resolvido
01:06:21com qualquer tipo
01:06:22de plantio
01:06:22mas as pesquisas
01:06:24para o roteiro
01:06:24da novela
01:06:25Velho Chico
01:06:26levaram a uma
01:06:27agrofloresta
01:06:28Velho Chico
01:06:29foi escrita
01:06:30por Bruno
01:06:31e Edmara
01:06:32e teve a supervisão
01:06:33de Benedito
01:06:34eu estudei 8 anos
01:06:36de agronomia
01:06:36visitei tudo
01:06:37que é bioma
01:06:37do mundo
01:06:38para chegar
01:06:38à conclusão
01:06:39que a resposta
01:06:40está aqui
01:06:40eu precisava
01:06:42de um projeto
01:06:42para o Miguel
01:06:43era o neto
01:06:44do coronel
01:06:44e o coronel
01:06:45era um coronel
01:06:46do agro tradicional
01:06:47um projeto
01:06:48que fosse sustentável
01:06:50o senhor tem que fazer
01:06:51algum trabalho
01:06:52de recuperação
01:06:52desse solo
01:06:53para falar
01:06:55com propriedade
01:06:56desse cultivo
01:06:57que imita
01:06:58a natureza
01:06:59Edmara
01:07:00estudou
01:07:00visitou
01:07:01projetos
01:07:01consolidados
01:07:02de agrofloresta
01:07:04e acabou
01:07:04transformando
01:07:05também
01:07:06essa área
01:07:06do sítio
01:07:07a gente tinha
01:07:10um solo
01:07:10que não infiltrava
01:07:11a água
01:07:11e corria a água
01:07:12hoje
01:07:12quando você
01:07:13começa a mexer
01:07:14aqui
01:07:14você começa
01:07:15a ver
01:07:15o sol está
01:07:15estruturado
01:07:16e aqui tem vida
01:07:17o público
01:07:19da novela
01:07:20Velho Chico
01:07:20também se mostrou
01:07:22terreno fértil
01:07:23teve uma repercussão
01:07:24assim
01:07:24absurda
01:07:25foi coisa assim
01:07:26de nove meses
01:07:27por semana
01:07:27para sete mil
01:07:28oito mil
01:07:29por semana
01:07:29perguntando sobre
01:07:30agrofloresta
01:07:31depois que Miguel
01:07:32entrou na história
01:07:33o telespectador
01:07:36quando ele está
01:07:36vendo uma nova televisão
01:07:38ele fica desarmado
01:07:39pela emoção
01:07:40e quando você
01:07:41encontra ele desarmado
01:07:42assim
01:07:42você pode jogar
01:07:44elementos educativos
01:07:45dentro da trama
01:07:46e aí ele assim
01:07:47mira muito bem
01:07:47Benedito adaptou
01:07:50alguns livros
01:07:51escreveu outros
01:07:52conviveu meses
01:07:53com personagens
01:07:54que saiam
01:07:55da sua cabeça
01:07:56e fez amigos
01:07:57entre os atores
01:07:58que os interpretaram
01:07:59o senhor Benedito
01:08:01é muito humano
01:08:01o senhor Benedito
01:08:03quando está escrevendo
01:08:04ele chora
01:08:05sofre com os personagens
01:08:06hoje o autor
01:08:08não escreve mais
01:08:09mas se alegra
01:08:10ao ver os amigos
01:08:11que bonitão
01:08:12que você está
01:08:13como é que estão
01:08:14as coisas
01:08:14como é que estão
01:08:15estão aí
01:08:16na correria
01:08:17para avaliar
01:08:17mas a gente bem
01:08:18na tv
01:08:19alguns trechos
01:08:20de trabalhos conjuntos
01:08:22ajudam a refrescar
01:08:23a memória
01:08:24fria essa cena
01:08:27linda
01:08:28renascer
01:08:29eu estou aqui
01:08:30filho
01:08:31vai nós chorando
01:08:39tudo de novo
01:08:40hein
01:08:40foi essa cena
01:08:47que te convenceu
01:08:48a fazer a novela
01:08:49Fagundes
01:08:49nós fomos lá
01:08:50a jantar
01:08:52aí o Rui
01:08:53contou
01:08:53como é que era
01:08:54a novela
01:08:55a história
01:08:55e tal
01:08:56e comecei a contar
01:08:57para ele
01:08:58choramos os dois
01:09:00na mesa
01:09:01e aí eu falei
01:09:03já
01:09:04que eu estou dentro
01:09:06ele ouviu
01:09:07e falou
01:09:08pode me escalar
01:09:09sou eu
01:09:10se você me jurar
01:09:11que vai fazer
01:09:11exatamente assim
01:09:13falou
01:09:13não vou mexer
01:09:14o marvio
01:09:15não mexeu mesmo
01:09:16e foi mesmo
01:09:17sucesso
01:09:18não me deu nada
01:09:19Benedito Rui Barbosa
01:09:30foi o autor
01:09:30com quem
01:09:31Fagundes
01:09:31mais trabalhou
01:09:32sete trabalhos
01:09:34e outro
01:09:34grande sucesso
01:09:35foi
01:09:36Rei do Gado
01:09:37deseja alguma coisa?
01:09:40essa menina
01:09:41eu vou falar
01:09:43uma coisa
01:09:43para você
01:09:44você encantou
01:09:45a vida
01:09:46de muita gente
01:09:47você não tinha
01:09:47o pó de pilim-pim-pim
01:09:48mas tem muita gente
01:09:50voar
01:09:51nas suas histórias
01:09:52é
01:09:54o menino
01:09:55da roça
01:09:56Benedito
01:09:56que não queria
01:09:57crescer
01:09:58se tornou
01:09:59um dos grandes
01:10:00como ele
01:10:01mesmo diz
01:10:01todo mundo
01:10:04tem uma boa
01:10:04história
01:10:04para contar
01:10:05algumas pessoas
01:10:06de sorte
01:10:07tem duas
01:10:08se você tiver
01:10:09três
01:10:09você já é
01:10:10um escritor
01:10:11o senhor foi feliz
01:10:13escrevendo novela?
01:10:15eu fui
01:10:15foi muito bom
01:10:17para mim
01:10:17aprendi
01:10:20para nós
01:10:21também
01:10:22Benedito
01:10:23mas ainda
01:10:23temos muito
01:10:24a aprender
01:10:25aprender
01:10:26a olhar
01:10:27um Brasil
01:10:27que você
01:10:28e o Globo Rural
01:10:29conhecem bem
01:10:31as comemorações dos 60 anos
01:11:01da Globo
01:11:01continuam ao longo da programação
01:11:04fique ligado
01:11:05bom dia para você
01:11:07bom domingo
01:11:08e uma ótima semana
01:11:09e uma ótima semana
01:11:39e uma ótima semana
01:11:43e uma ótima semana
01:11:44e uma ótima semana