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O fotógrafo revisita seus arquivos para apresentar no IMS Paulista mais de 250 imagens, 190 delas inéditas, que reforçam sua obsessão pelo ordinário nos cenários superlativos de Belém do Pará.
Transcrição
00:00Música
00:00Essa aqui é uma foto bem característica do que as pessoas conhecem da minha obra, né?
00:22Da cor, da brincadeira entre as temperaturas de cor, quer dizer, essa foto tecnicamente,
00:27né, by the book, né, ela é errada, porque ela foi feita com filme para a luz do dia,
00:34usado na luz artificial, de vapor de mercúrio, numa temperatura de cor que está tudo distorcida,
00:41mas foi isso que abriu um caminho e que me permitiu construir toda uma série de imagens,
00:47na verdade uma obra pela qual eu sou reconhecido, através de supostamente um erro que eu transformei
00:53numa coisa a meu favor, entendeu?
00:57Eu acho que o arquipélago imaginário, que eu acho que é um título perfeito para o que se construiu aqui,
01:09é exatamente fruto da possibilidade que a fotografia traz de você revisitá-la.
01:14Claro que para isso eu precisei guardar, e muito bem guardado, ao longo de quase cinco décadas.
01:19Então, ao revisitar essas imagens e com a maturidade que o tempo traz e que o próprio percurso traz,
01:27eu pude identificar diversas imagens que na época que eu fiz, seja pela pressa, pela sobrevivência,
01:35porque eu trabalhava muito como fotógrafo comercial, eu talvez não teria dado a devida atenção.
01:40Então, ao revisitar, eu comecei a fazer uma pasta, tipo assim, os achados, né?
01:46Quando surgiu o convite do Marcelo para fazer os meus 50 anos, celebrar os meus 50 anos aqui no IMS,
01:53eu de certa forma já tinha material sobre o qual o Bitu se debruçou e conseguiu montar esse grande arquipélago,
02:03com nove núcleos, que de certa forma são quase que uma cartografia da minha alma e dos meus afetos.
02:11Essa ideia do arquipélago vem bem da dimensão geográfica do território ao qual tratamos,
02:18o estado do Pará, em específico Belém e Marajó.
02:23Então, essa dimensão do território e a relação e o interesse de Luiz pela Amazônia Ribeirinha
02:30e a intimidade que vai se construindo nessa perspectiva entre esse corpo do fotógrafo,
02:36a paisagem e as relações construídas nessa ambiência,
02:40é que vão também conduzindo alguns momentos e a maioria dos núcleos.
02:52A exposição é dividida em dois pisos, formada por 258 imagens,
03:00desse conjunto, 190 são inéditas e a maioria em preto e branco.
03:06Então, o público é convidado a desbravar outras perspectivas na imagem de Luiz Braga
03:13a partir de pesquisas iniciais do seu processo.
03:19Uma quase que obsessão pelo ordinário,
03:22pelas coisas simples, pelas coisas que, em geral, as pessoas passam e não veem,
03:27aquelas atividades pequenas, aquelas ações que estão à margem do olhar normal
03:35que as pessoas fazem no seu vai e vem para o trabalho.
03:38Então, eu sempre procurei olhar,
03:40eu acho que é uma tendência minha mesmo,
03:42de procurar olhar para esse universo do cotidiano,
03:45das coisas simples e, neles, através da fotografia,
03:50transformar em algo extraordinário,
03:52carregado de afeto e de significado, principalmente.
03:56Então, a exposição, ela convida o público a espiar
04:01para essa obra tão instigante do fotógrafo paraense.
04:05No percurso da espografia,
04:08muitos espaços são cortados por janelas
04:10em que o público consegue atravessar ou espiar o outro lugar.
04:16E Luiz utiliza muito espiar como metodologia poética
04:19nessa aproximação com o outro e nessa construção com o outro,
04:23que é um lugar bonito e potente na construção dessas imagens.
04:31Fiquei super feliz quando eu, de fato, descobri essa foto
04:35que estava no meu arquivo desde 1976,
04:40feitas com a Rasselblad, no cílio de Nazaré,
04:42e que estava guardadinha e eu nunca tinha visto ela ampliada.
04:45Para mim, foi um prazer imenso ver essa foto
04:48aparecendo na banheira do laboratório do IMS lá no Rio.
04:52Porque ela foi feita, aliás,
04:54todas as fotos pretas e brancas que estão aqui
04:56foram feitas no modo analógico,
04:58com o ampliador, na banheira de revelador, fixador.
05:01Então, isso também é muito bom para as pessoas
05:04que gostam de fotografia, que apreciam a fotografia,
05:07virem ver como é que a fotografia em preto e branco
05:10pode ser feita.
05:12Porque hoje tudo é digital,
05:13a captura digital, impressão em jato de tinta.
05:16Então, aqui não.
05:17Aqui é filme, revelado como filme,
05:20ampliado no ampliador
05:22e mostrando um Luiz Braga
05:24que muita gente não conhecia.
05:31As pessoas, às vezes, pensam que você já nasce feito,
05:35que você já nasce pronto,
05:37já nasce famoso, rico, célebre.
05:40E eu acho que tudo é uma construção.
05:41É uma construção onde cada tijolinho desses
05:44vem de um lugar.
05:46Às vezes, vem até de onde você não espera.
05:48Mas, por exemplo, no meu caso,
05:50vem da poesia de Fernando Pessoa,
05:52de Walt Whitman,
05:53vem do cinema de Fellini,
05:55vem da fotografia de Maureen Visiliar.
05:58Saúl Leiter é um puta fotógrafo americano
06:00que pouca gente ainda conhece.
06:02O Joe Mayrovitz,
06:03que trabalha com aquela mistura
06:05de temperaturas de cor.
06:07O José Medeiros, maravilhoso no Brasil,
06:09que ainda precisa ser mais divulgado.
06:13Bário Cravo Neto,
06:15que nos deixou tão cedo.
06:16Então, são diversas influências
06:18que vão te moldando
06:20e fazendo que você, inclusive,
06:23entenda, às vezes,
06:24que o que você está fazendo tem sentido.
06:26Eu vejo, às vezes, que talvez,
06:29talvez as redes sociais
06:31tenham banalizado a imagem.
06:33Talvez.
06:34Tem uma coisa aqui,
06:35até uma brincadeira
06:36que eu já vi a respeito dos escritores.
06:38Todo mundo sabe escrever,
06:40mas nem todo mundo realmente consegue,
06:42através da escrita,
06:44ser um poeta,
06:45um romancista,
06:46um ensaísta.
06:47E eu acho que a fotografia é isso aí.
06:49Uma outra coisa que eu tenho refletido muito
06:55é essa questão do tempo.
06:57As pessoas têm,
06:58por norma,
07:00historicamente,
07:02sempre querer saber
07:03essa fotografia,
07:05onde foi?
07:06Quando foi?
07:07Quem foi?
07:09E cada vez mais eu estou tentando
07:10me afastar disso,
07:12porque eu acho que a fotografia,
07:13quando ela passa a ser fotografia
07:15como poesia,
07:17como expressão de um artista
07:19sobre uma determinada coisa,
07:21ela não precisa mais disso.
07:23Eu sei que a gente sempre está fotografando
07:24alguma coisa que existe ou existiu,
07:26mas quando ela passa a ser fotografia,
07:28ela já não é mais a realidade,
07:31ela já é fotografia.
07:32Então, por exemplo,
07:32aqui,
07:33essa imagem aqui,
07:34se a gente for falar no tempo cronológico,
07:36ela é uma imagem de 2004.
07:38Essa imagem aqui é de 2023.
07:40esse díptico já é parte
07:43de uma construção posterior,
07:46onde o tempo cronológico
07:47não interessa mais,
07:48interessa o que a gente quer falar.
07:50Aqui é religião,
07:51aqui é uma igreja,
07:52aqui é a coroação de Maria,
07:54em lugares diferentes,
07:55em tempos diferentes,
07:56cronologicamente falando.
07:58Mas aí vira uma outra coisa,
08:00aqui já é um outro planeta,
08:02já não é mais onde foi feito.
08:03Eu poderia dizer assim,
08:09ah, você tem mais de 500 mil fotos
08:11no seu acervo.
08:12Por que você ainda continua fotografando?
08:15Porque eu preciso.
08:16A fotografia, para mim,
08:18é o que me aproxima da vida,
08:21é o que me faz vivo,
08:22é o que me mostra caminhos,
08:24é o que me faz entender a mim mesmo.
08:27Então, é por isso que eu continuo fotografando.
08:29Eu tenho consciência de que,
08:30obviamente,
08:30tudo que eu produzi,
08:32eu não vou conseguir ver
08:33nessa vida,
08:35mas pelo menos as pessoas
08:36vão ver o meu rastro.
08:37Eu não vou conseguir ver o meu rastro.
08:40Eu não vou conseguir ver o meu rastro.
08:41Eu não vou conseguir ver o meu rastro.
08:44Eu não vou conseguir ver o meu rastro.
08:47Eu não vou conseguir ver o meu rastro.
08:50Eu não vou conseguir ver o meu rastro.
08:52Eu não vou conseguir ver o meu rastro.
08:53Eu não vou conseguir ver o meu rastro.