• anteontem
Vitória 400 Anos (Berilo Neves - Jornal A Noite - 1951).
O povo **espírito-santense** celebrou, com intenso júbilo cívico e religioso, o quarto centenário de sua formosa capital.

Defendida dos insultos do mar e das agressões do vento por uma muralha de pedra, Vitória, como São Sebastião do Rio de Janeiro, é um milagre da fé e da persistência dos portugueses do século XVI. Para mantê-la fiel a Portugal e a Jesus Cristo, foi necessário grande esforço e, não raro, martírio cruento.

A influência dos padres jesuítas deve à cidade o seu nome e a sua fama. O maior dos apóstolos do Novo Mundo, o Padre Anchieta, deu-lhe um pouco de sua alma, inteiramente dedicada à catequese do Brasil selvagem — e, para selar eternamente a aliança que com a terra fizera, foi no Espírito Santo que ele deixou sua alma puríssima e evangélica elevar-se para Deus.

A morte do Venerável José de Anchieta é, por si só, um quadro bíblico, desses que deveriam estar em todos os lares cristãos do mundo, pela admirável lição que encerram e pelo alto simbolismo que traduzem.

Por toda parte onde andaram, os jesuítas deixaram colégios que eram oficinas onde formavam almas para o serviço da religião e da pátria. O maior e mais belo edifício de Vitória ainda é aquele que os padres da Companhia de Jesus erigiram — como sempre, está situado numa eminência, para, ao mesmo tempo, escapar à ambição dos homens e estar mais perto de Deus...

Por isso, Vitória surge, transpostos os obstáculos com que a Natureza a resguardou, como um nicho onde a Senhora esplende, sorri e consola...
Muitas vezes, os viajantes costumam compará-la a um presépio porque, realmente, é digna de que nela habite o Deus Menino... O milagre que emana desse presépio contagia a alma do povo, que é tristemente bom e acolhedor...
Dificilmente se encontrará, em algum lugar, espírito de hospitalidade maior do que aquele que caracteriza a gente capixaba... Sabem-no todos os que tiveram a ventura de transpor os umbrais de pedra da encantadora Vitória...

Num dos pontos elevados da cidade está o Convento da Penha, cujo altar conserva a imagem da Senhora de quem toma o nome...
Essa Virgem admirável, apenas em duas outras ocasiões, em mais de trezentos anos, saiu de seu templo para consolar e abençoar os fiéis que lá vivem, na humildade da planície... Agora, reproduzindo o fato histórico, a Senhora da Penha saiu de seu esconderijo secular e passeou à plena luz do dia, como se fosse para demonstrar sua alegria ao ver Vitória cada vez mais bela...

A bênção do Padre Anchieta, assim, tem frutificado através dos séculos e sempre presidirá à urbe admirável, que parece ter herdado uma parte de sua alma taumatúrgica — tantos são os milagres de beleza que, de toda parte, surpreendem o forasteiro, seja do alto das pedras dominadoras, seja da planície quieta, ou ainda, da superfície espelhante do mar.

De BERILO NEVES (da "A Noite").

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